sábado, 30 de junho de 2012

Daquilo que amamos



Comprei ontem o último livro da Helena Sacadura Cabral. Numa das suas crónicas descreve uma situação que partilhou com uma amiga dela (*). Estavam as duas juntas quando se cruzam com o homem que ocupou, sem quebras, o coração da amiga durante 30 anos. Passados estes anos todos deparam-se com um homem gordo, careca, desmazelado, que passara 15 anos preso no estrangeiro. Embora em silêncio não conseguiram esconder a surpresa e a decepção. A amiga diz-lhe: 30 anos da minha vida Helena, 30 anos à espera deste homem que acabaste de ver...!
Quando acabei de ler o texto não consegui evitar lembrar-me  de uma frase de Fernando Pessoa, que sublinhei há muito tempo no Livro do Desassossego e que diz: Nunca amamos alguém. Amamos, tão-somente a ideia que fazemos de alguém. E se há dias em que esta concepção me passa ao lado, outros há em que entendo o que está por trás desta frase. Às vezes não sei se aquilo que se ama é a própria pessoa ou a conceptualização que se faz da pessoa, a ideia que nós próprios construímos de alguém. Aquilo que acabamos por gostar nos outros é aquilo que mais nos agrada e que, de um modo egoísta, nos faz sentir bem e confortáveis. Acrescenta Fernando Pessoa que afinal, é a nós mesmo que amamos. E não será a nós mesmos que amamos quando amamos nos outros coisas que nós próprios valorizamos?
Às vezes, e não são raras essas vezes, acho que amo mesmo as possibilidades. As possibilidades do que poderia ter sido, as possibilidades do futuro. As possibilidades que nunca passarão disso mesmo, de possibilidades.


(*) in: Aquilo em que eu acredito

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